Alta Idade Média: a formação da ordem feudal na Europa Ocidental 

Alta Idade Média: a formação da ordem feudal na Europa Ocidental 

O portal Estratégia Militares já falou anteriormente sobre Idade Média, mas este conteúdo é tão rico e importante para os Concursos Militares que vamos continuar falando sobre ele. Este post traz informações importantes sobre o período considerado Alta Idade Média. Confira!

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Conceitos Históricos

A primeira coisa a ser entendida quando o assunto é Alta Idade Média é que essa experiência histórica localizou-se na porção ocidental do Império Romano

O alvorecer da Idade Medieval está marcado por um ato inaugural: as invasões bárbaras – segundo afirma o professor Jacques Le Goff em seu livro “A Civilização do Ocidente Medieval”1. Assim, se as ocupações germânicas são o ato inicial desse processo – como afirmam os medievalistas – vamos estudar a seguir a formação dos reinos bárbaros, procurando elementos que impulsionam a formação do mundo feudal.

Assim, para Le Goff, o mundo medieval nasceu sobre as ruínas do mundo romano, pois Roma teria alimentado o surgimento da Idade Média2. Esse estudioso e vários outros medievalistas, como Giorgani, defendem a tese de que:

“A invasão é o fato inicial da Idade Média. Nenhum fato da mesma amplitude ou de consequências comparáveis se produziu depois, e a História subsequente, entendida corretamente, nada mais foi que a evolução da sociedade resultante da invasão. É necessário entender por invasão a compenetração desses dois elementos até então separados: o civilizado grego ou latino, helenizado ou latinizado, e o bárbaro recém-chegado sobre o solo imperial.” (GIORGANI, 1968, p.21).

Segundo o argumento citado acima, o ato inicial não é simplesmente a chegada dos povos não romanos em terras do Império Romano, mas a compenetração e a fusão destes dois elementos: romanos e germânicos.

No mesmo sentido, o professor inglês Perry Anderson, em seu livro “Passagens da Antiguidade ao Feudalismo”3, elabora a tese de que a ordem feudal – ou o mundo feudal – foi a síntese da interação entre os modos de vida dos romanos e dos germânicos

Conclusão: Essa interação se deu em um contexto de decadência dos dois modos de vida. Nem os romanos e nem os germânicos podiam mais sustentar seus velhos padrões de reprodução material e subjetiva a partir do século V. Era preciso superar suas crises e ambos estavam nessa busca.

Nesse cenário de ruína do Império Romano do Ocidente e da chegada dos povos bárbaros houve o encontro, a interação e o choque de civilizações. Assim, dessa experiência histórica nasceram novas formas de 

  • ver o mundo: 
  • reproduzir as condições materiais que permitiam a sobrevivência, 
  • se relacionar uns com os outros e, 
  • representar o mundo espiritual. 

A esse novo mundo damos o nome de Mundo Feudal.

Para compreender o Mundo Feudal, é preciso esboçar a estrutura constitutiva do modo de produção feudal. Ou seja: entender os elementos que interagiram e qual foi o resultado dessa interação. O estudo desse período demanda análise dos elementos colocados nos seus contextos específicos. 

Esses momentos de transição entre o Velho Mundo e a formação do Novo são os mais difíceis de estudar porque é tudo muito fluido; é a desintegração do primeiro e a formação do segundo. 

Mesmo quando o Novo Mundo parece já estar imponente e forte, conseguimos perceber que o Velho insiste em lembrar que ele continua existindo. Por isso, quando falamos em mundo feudal, estamos tratando de economia, sociedade, política, cultura e religião, ou seja, do homem e do seu modo de viver

Portanto, o Feudalismo (ordem feudal) é uma tipologia criada pelos historiadores a partir da generalização dos aspectos políticos, econômicos, sociais e religiosos. Mas, nunca se deve perder o senso crítico sobre o processo. 

Vamos partir deste pressuposto: a formação dos reinos germânicos foi produto da desagregação do Império Romano do Ocidente e do movimento de ocupação dos germânicos nessa região que, até então, era dominada pelos romanos. A síntese desses dois processos teve como consequência o impulso para a formação da Ordem Feudal no centro da Europa.

Se as ocupações germânicas são o ato inicial desse processo, como afirmam os medievalistas, é preciso estudar a formação dos reinos bárbaros, procurando os elementos que impulsionam a formação do mundo feudal.

Vamos entender situações daquele momento de desagregação do Império Romano ocorrido entre os séculos III e V d.C.

Embora saibamos que a marca factual do fim do período da Antiguidade seja o fim do Império Romano do Ocidente, fica o alerta para o fato de que as migrações dos povos germânicos para as regiões que antes formavam o império não pararam em 476. 
Na Alta Idade Média, ou seja, entre os séculos V e X, os germânicos continuaram se deslocando por toda a Europa Ocidental. Observe o mapa das principais migrações desses povos:

As constantes disputas territoriais entre esses povos, no contexto da desagregação do mundo romano, promoveram: 

1- Declínio das rotas comerciais; 

2- Produção agrícola ao nível da subsistência; 

3- Concentração populacional em agrupamentos ou comunidades rurais; e 

4- Construção de castelos e moradias fortificadas, cercadas por muralhas para garantir proteção contra agressões externas. 

Isso descreve o fenômeno da ruralização da sociedade, que marcou o que viria a se consolidar como Feudalismo. Ou seja, as cidades perderam importância e o ambiente rural se fortaleceu. Agora, vamos analisar as consequências desse processo para a organização da sociedade. 

A vida se tornou privada ou reclusa. As relações sociais, econômicas e políticas passaram a se desenvolver no espaço privado da organização familiar, dos seus castelos fortificados, guardados por leais cavaleiros. 

Por isso, falamos que no processo de formação da nova ordem social – que seria a feudal – não se tratava mais da res-publica, daquele espírito do bem comum. E se não havia mais o espaço para esse tipo de organização social, a política também se tornou privada. 

Michel Rouche4 afirma: 

“Antes a alegria de viver estava nas ruas e nos grandes monumentos urbanos; agora se refugia nas casas e nas cabanas. Antes, com suas leis, tropas e edis*, o Império se honrara em facilitar a vida pública como ideal de vida; agora, com os reinos germânicos, dilui-se o culto da urbanidade em proveito da vida privada. Para os recém-chegados, os germanos, quase tudo é de domínio privado.” (*Administradores públicos plebeus) 

A ruralização da sociedade, naquele contexto, levou à falência do modelo político do espaço público. Houve uma alteração do espaço em que se tomavam as decisões, veja o esquema:

Alguns historiadores interpretam essa mudança como uma regressão no desenvolvimento da política pública. Leia um trecho do professor Le Goff que demonstra essa visão: 

“(…) sobretudo no domínio da organização política e no domínio da cultura, …. eles precipitaram, agravaram, exageraram a decadência que se tinha iniciado sob o Baixo Império. De um declínio, eles fizeram uma regressão.” Regressão quantitativa, regressão técnica, regressão do gosto e dos costumes e regressão da administração e da majestade de governo, eis o saldo das invasões dos Bárbaros.5

Esse cenário rural e privado era propício para a adaptação dos povos germânicos devido às suas características culturais. 

Vamos ler um trecho do texto escrito por Tácito, um historiador Romano, sobre os povos germânicos. Perceba a relação que o autor estabelece entre a política, a guerra e a família.

“Os reis são escolhidos segundo sua nobreza, os chefes segundo sua coragem. Mas o poder dos reis não é ilimitado, nem arbitrário e os chefes, mais pelo exemplo do que pela autoridade, tomam as decisões, atraem os olhares, combatem na primeira linha, impõem-se pela admiração. Além disso, ninguém tem o direito de tirar a vida, de acorrentar, mesmo de fustigar, a não ser os sacerdotes, não a título de castigo, nem sob a injunção de um chefe, mas como se a ordem viesse do deus que eles acreditam estar presente ao lado dos combatentes. Os germanos levam à batalha imagens e emblemas que tiram dos bosques sagrados, mas o que estimula singularmente a bravura, não é nem o acaso, nem a disposição fortuita que constitui o esquadrão, nem os cantos, mas sim as famílias e os parentes.” 6

Segundo Tácito – e diversos medievalistas concordam com ele – o espaço privado das relações domésticas e familiares era o lugar privilegiado das decisões importantes para os povos germânicos. Assim, podemos concluir que havia uma tendência de se constituir uma sociabilidade mais ligada às relações pessoais e familiares em que os olhares públicos não eram capazes de alcançar. 

O que levou os povos não-romanos a se deslocarem tanto pelo território europeu? 

Os deslocamentos desses povos foram motivados, primeiramente, pelo nomadismo e pelas expulsões das terras que um povo provocava no outro. Contudo, há algo que ajuda a entender mais profundamente esse comportamento dos “bárbaros”. 

Sobre isso, uma parte dos historiadores, como E. A. Kosminsky, explica que eles se dedicavam a um tipo de agricultura predatória e cultivavam mal a terra. Segundo esse historiador, esses povos “queimavam os bosques ou cultivavam a camada superficial da terra virgem, nas planícies, faziam a colheita e logo abandonavam essa terra por muitos anos e iam cultivar outras terras virgens”. 

Sendo assim, em algum momento foi inevitável chegarem na zona fronteiriça do Império Romano. Tratava-se da falta de conhecimento de como trabalhar melhor a terra. Com sua chegada às terras do império romano, um dos resultados da interação cultural entre romanos e germânicos foi essa aprendizagem. 

No entanto, outros historiadores colocam mais ênfase nas perseguições de um povo bárbaro sobre o outro, ou na atração por territórios mais ricos, ou mesmo no crescimento demográfico dos povos bárbaros.

Entendeu tudo sobre a Alta Idade Média? Conseguiu compreender seus pontos chaves? Agora estude mais sobre o assunto em nosso material, pois ele pode cair nas provas dos Concursos Militares. 

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Veja também:

Texto elaborado com base no material didático da professora Alê Lopes.

Referências Bibliográficas: 

1 LE GOFF, Jacques. A Civilização do Ocidente Medieval. Lisboa: Editorial Estampa. Vl. 1. 1983, p. 29. 

2 LE GOFF, Jacques, Idem. p. 27. 

3 ANDERSON, Perry. Passagens da Antiguidade ao Feudalismo. São Paulo: Ed. Brasiliense, 1989.

4 ROUCHE, Michel. Alta Idade Média Ocidental, p. 403.

5 LE GOFF, Jacques. A civilização do Ocidente Medieval, 2005. 

6 TÁCITO. A Germânia. In: PINSKY, Jaime (org.). 100 textos de História Antiga. São Paulo: Contexto, 1988. p. 74-75

7 ANDERSON, Perry. Op. Cit.,p. 126. 

8 ANDERSON, Perry. Passagens da Antiguidade ao Feudalismo. São Paulo: Ed. Brasiliense, 1989, p. 131.

9 DUBY, Georges. História artística da Europa: A idade Média. São Paulo: Ed. Paz e Terra, 1997. 

10 ARRUDA, José Jobson de A. Atlas Histórico Básico. São Paulo: Ed. Ática, 2008, p 13 

11 BASCHET, J. A civilização feudal. Do ano mil à colonização da América. São Paulo: Ed. Globo Livros, 2014

12 ARRUDA, José Jobson de A. Atlas histórico básico. São Paulo: Ática, 2008. p.15.

13 LE GOFF, Jacques. A civilização ocidental medieval. Lisboa: Ed. Estampa, 1983

14 Eadmer de Cantebury. Apud. COTRIM, Gilberto. História Global. Brasil e Geral. São Paulo: Ed. Saraiva, 2012, p. 179. 

15 COTRIM, G. Gilberto. História Global. Brasil e Geral. São Paulo: Ed. Saraiva, 2012, p. 178.

16 AMIM, Mônica. Idade Média:um tempo de fazer cristão. In: Revista ComparArte, Rio de Janeiro, Volume 01, Número 01, JanJun 2017, pp. 12116-142. 

17 Castelães, nesse caso, era o dono do castelo ou o senhor de terra.

18 KOSMINSKY, E.A. História da Idade Média. Centro do Livro Brasileiro. Sem Data. p.35.

19 Víveres eram os mantimentos ou alimentos necessários à sobrevivência

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