Alta Idade Média: o papel da Igreja Católica na formação do mundo feudal

Alta Idade Média: o papel da Igreja Católica na formação do mundo feudal

O portal Estratégia Militares preparou uma série de conteúdos falando sobre Idade Média. Já tratamos da formação da ordem feudal na Alta Idade Média em um post anterior. Desta vez, vamos falar do papel da Igreja Católica na construção do feudalismo na Europa. Confira a seguir!

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Fortalecimento da Igreja Católica

Ao mesmo tempo em que ocorria o processo de ruralização, de aprofundamento da economia rural de subsistência e da privatização da vida social e política, o Cristianismo e a Igreja Católica se fortaleceram. Vamos ver como isso ocorreu. 

Nos últimos séculos do Império Romano, alguns imperadores se converteram ao Cristianismo e, com isso, estabeleceram relações entre a religião cristã e a política. Como consequência, houve crescimento do Cristianismo e fortalecimento da instituição religiosa. Veja a seguir:

Assim, no final do Império Romano, a Igreja Cristã formava uma super burocracia, segundo Perry Anderson. Os membros do clero eram funcionários do Estado, mais numerosos que os demais funcionários públicos e também com salários superiores. 

Esse era o poder da Igreja que, de certa forma, contribuiu para o desequilíbrio fiscal da máquina estatal romana. 

No entanto, sua capacidade material de resistir ao esfacelamento do Império Romano estava relacionada à cristandade que a sustentava financeiramente. Em especial, os senhores ricos que se converteram ao Cristianismo. 

Dessa maneira, ela manteve sua capacidade de atuar, mesmo no contexto pouco favorável das invasões bárbaras. Além disso, muitos bárbaros se converteram ao Cristianismo e até doaram terras à Igreja, em alguns casos.

Por isso, muitos historiadores afirmam que a Igreja Católica foi a única instituição sobrevivente do Império de Roma. Apesar dos conflitos teológicos que marcaram toda a Idade Média e que foram fruto das divergências de interpretação doutrinária, a Igreja de Nicéia – ou Católica – se firmou como a representante de Roma, especialmente, na porção ocidental do antigo império. Nas palavras de Anderson:

“O complexo infra e supra estrutural que iria compor a estrutura geral de uma totalidade feudal na Europa teve assim uma dupla origem, depois do colapso e confusão do início da Idade Média. Entretanto, uma única instituição abarcou toda a transição da Antiguidade à Idade Média em continuidade essencial: A Igreja Cristã.”7 

Porém, qual foi o papel da Igreja, nesse processo entre os séculos V e IX, até a ordem feudal se consolidar? 

Na formação do feudalismo há um suporte estrutural, algo como uma ponte que liga os elementos desse processo. Quem cumpre essa “função de ponte” na transição da Antiguidade para o estabelecimento da ordem feudal é a Igreja Católica

Essa instituição assumiu uma posição de continuidade e manutenção do antigo Império Romano e, por isso, foi a “ponte” entre o passado e o futuro. Segundo Perry Anderson: 

“Ela foi, realmente, o principal e frágil aqueduto sobre o qual passavam agora as reservas culturais do Mundo Clássico ao novo universo da Europa Feudal, onde a escrita se tornara clerical… A Igreja foi a indispensável ponte entre duas épocas, numa passagem “catastrófica” e não “cumulativa” entre dois modos de produção.”8 

Mesmo com o colapso do Estado Romano, a cristandade sustentou a estrutura e a hierarquia eclesiástica da Igreja. Por isso, ela continuava sendo o baluarte de uma Roma que se desfazia no horizonte. Sua mentalidade, rituais e penetração social permitiam exercer esse papel de continum no tempo. 

Porém, simultaneamente, havia uma flexibilidade na percepção e na reelaboração das novas demandas. Assim, a necessidade de converter germânicos e, ao mesmo tempo, firmar-se entre os cristãos, colocava a Igreja longe de uma postura intransigente. 

De toda maneira, foi essa Instituição que ficou no centro do processo de síntese da interação entre romanos e germânicos – e entre passado e futuro. É por isso que a questão religiosa tem um espaço muito grande nas explicações da formação desse “Novo Mundo Feudal”. 

Por tudo isso, o papel da Igreja na transição da Antiguidade para o Feudalismo se localizou na esfera cultural. De certa forma, ela foi responsável pela criação de uma “superestrutura mental”, ou simplesmente pela formulação de uma mentalidade medieval marcada por uma característica: a de conciliar. 

Nessa difícil transição, o que marcou a atuação da Igreja foi sua flexibilidade e não o seu rigor. Por isso, ela reorganizou a interpretação sobre alguns assuntos caros quer fosse para os romanos, quer fosse para os germânicos

Por exemplo, a doutrina cristã criou uma noção de justiça que buscava uma harmonia entre os homens. Assim, era possível enfrentar a escravidão exigindo que os senhores fossem justos com seus escravos. 

Da mesma forma, ao Cristianismo correspondia o sentimento de injustiça da massa da população miserável, que vivia tanto do lado dos romanos quanto do lado dos bárbaros. Por essa razão, é comum a historiografia afirmar que a Igreja Católica possuía um sentido universal, isto é, conquistar adeptos independentemente do povo a que a pessoa pertencesse. 

Com isso, foi se formando um contexto de relações em que se pretendia anular as tensões e os conflitos. Criou-se, assim, a estrutura mental que formou um dos pontos desse novo mundo cultural. Essa mentalidade dará suporte para a formação de uma sociedade estamental de três ordens: 

  • clerical; 
  • nobre; e 
  • servil. 

Outro exemplo está relacionado com a expansão da língua latina e, portanto, com a cultura clássica. Durante o Império Romano, a grande massa não conhecia o latim – língua dos governos e das elites intelectuais. Desse modo, a expansão do Cristianismo subverteu essa ordem. 

Alguns autores afirmam que isso vulgarizou e corrompeu a cultura clássica por meio de um processo de assimilação e adaptação dos elementos clássicos por uma população mais vasta. Estes, especialmente os povos germânicos, teriam-na arruinado. Argumento forte, polêmico e aristocrático. 

De qualquer maneira, a cultura surgida nesse processo foi uma fusão de elementos romanos e germânicos e a Igreja foi a responsável por salvaguardar e transmitir a herança clássica. Assim, as novas línguas – espanhol, português, francês – que se consolidaram nesse momento foram a expressão dessa experiência histórica. 

É importante ressaltar que, nesse momento de transição, como parte das interações socioculturais ocorridas entre os povos romanos e germânicos, houve a conversão de muitos não romanos ao Cristianismo. Veja o que diz o especialista em cultura medieval Georges Duby: 

“Entretanto, a cultura romana conservou o seu prestígio. Fascinou os invasores. Foi para se alçarem ao seu nível, para participarem dessa espécie de felicidade que julgavam partilhada pelos romanos, que os germanos atravessaram as fronteiras, que seus chefes, agora detentores do poder, não hesitaram em se autodenominar cônsules* que moravam nas cidades, que favoreciam o desabrochar das letras latinas, que arrastavam os companheiros e, como Clovis, mergulhavam nas águas do batismo. Tinham apenas um desejo: integrar-se. Para se integrarem, de verdade, precisavam virar cristãos.” 9

Estudar a aproximação entre a Igreja Católica e alguns povos germânicos é de máxima importância para compreendermos a formação da mentalidade e da organização social e política do que virá se constituir como a ordem feudal.

Vamos usar o exemplo de um dos reinos romano-germânico cristãos que nos ajudará a entender o processo descrito – trata-se do Reino Franco

O Reino dos Francos

No período final do Império Romano – na região central do que conhecemos hoje como França -, povos germânicos ali se instalaram e deram início à construção do Reino dos Francos. Este Reino se tornou o mais importante da Alta Idade Média. Veja-o no mapa:

Dinastia Merovíngia (451-751)

Um cavaleiro franco, Meroveu, considerado o herói da batalha dos Campos Catalúnicos, em 451, deu início ao que ficou conhecido como a Dinastia Merovíngia. 

Seu neto, o príncipe Clóvis, foi considerado o fundador do Reino Franco. Foi ele quem arquitetou, entre 481 e 511, o Estado Franco – fruto das vitórias militares que ele e seu exército obtiveram nas disputas territoriais com romanos,  visigodos,  burgúndios e alamanos, entre outros povos bárbaros. 

Elemento fundamental para a formação do Reino Franco foi a conversão de Clóvis ao Cristianismo, em 496. Ele estava perdendo uma batalha, quando pediu ajuda aos santos da religião de sua esposa, que era católica. Nesse momento, inverteu-se sua posição na batalha e seu exército teria saído vitorioso. 

A partir desse momento, Clóvis aderiu ao Cristianismo. Com essa decisão, o príncipe conquistou a simpatia dos povos de origem romana, bem como o apoio da população da Gália e da Igreja Católica. Em troca da aliança que se iniciaria no Reino dos Francos, a Igreja recebeu terras, muitas terras. 

Começava, assim, uma relação específica da Europa Ocidental: a Igreja Romana reconheceu a legitimidade política dos reis e de suas conquistas territoriais. Por gratidão, os reis doavam terras e garantiam proteção à Igreja. 

Perceba que a relação entre o chefe religioso e o chefe político-militar não foi de subordinação, mas de interação – pelo menos nesse primeiro momento. 

Dê uma olhada em alguns documentos relacionados com o tema

  • Carta de Pepino, de 754: marca a passagem da dinastia Merovíngia para a dinastia Carolíngia. Pepino, o Breve, fez aliança entre o reino franco e o papado, que ficou selada, simbolicamente, pela unção, recebida por Pepino, das mãos do Papa Estevão II. 
  • Carta de doação de Constantino: durante o reinado de Carlos Magno, o Papa Adriano I apresentou um documento forjado nas oficinas da própria Igreja. Esse documento seria uma antiga carta em que o Imperador Constantino teria doado terras da Itália Central à Igreja. Carlos Magno anuiu o documento, baseado na Carta de Pepino e na Carta de Constantino, elaborou outro documento que cedia mais terras ao papado. 
  • Documento Capitular de 817: intitulado Ordinatio Imperii: documento redigido no reinado de Luís, o Piedoso, três anos depois da morte de Carlos Magno. Com esse documento, buscou-se delinear, com maior precisão, os mecanismos de sucessão imperial no Ocidente, associando-os a um único herdeiro, de modo que a coroa deveria ser posta na cabeça do imperador pelo Papa.

Nesse momento, apesar de o início do Reino Franco ter sido marcado por um Estado centralizado, as constantes disputas pela sucessão do trono, somada à baixa autoridade dos reis seguintes a Clóvis, enfraqueceram o poder real

Com isso, desencadeou-se um processo de descentralização do poder em direção aos senhores proprietários de terra, pois estes começaram a assumir tarefas políticas e militares para protegerem suas terras, famílias e agregados. São esses os futuros  senhores feudais que participarão da consolidação da ordem feudal. 

Quem eram os senhores proprietários de terras? Eram os antigos patrícios da época do Império Romano do Ocidente e/ou os bárbaros que invadiam as terras destes durante o processo de fusão entre elementos romanos e germânicos.

Pois bem, essa fusão, na prática, tinha a propriedade da terra como elemento factual. Assim, os germânicos ocuparam terras romanas pacificamente, ao trabalhar para romanos como colonos; ou violentamente, pilhando e invadindo as terras dos patrícios. Leia um mais um trecho de um artigo sobre a desagregação do Império Romano: 

“Houve vários episódios sangrentos, conflitos militares, incursões violentas e ocupações de cidades – certamente, aqueles aos quais as narrativas dos cronistas deram maior relevo. Entretanto, a instalação dos povos germânicos deve ser imaginada sobretudo como uma infiltração lenta, durando vários séculos, como uma imigração progressiva e muitas vezes pacífica, durante a qual, os recém chegados se instalaram individualmente, aproveitando-se dos seus talentos artesanais ou pondo sua força física a serviço da armada romana; ou também em grupos numerosos, beneficiando-se, então, de um acordo com o Estado Romano que lhes concedia o estatuto de “povo federado.” O Império soube, então, em um primeiro momento, absorver essa imigração ou compor com ela, antes de desaparecer sob o efeito de suas próprias contradições, exacerbadas à medida que a infiltração estrangeira se ampliava.” (p. 50)11 

Com muita indefinição nas sucessões do trono franco, a organização político-administrativa desse reino, entre os séculos VI e VII, passou a contar com o major Domus ou, o “prefeito do palácio” – uma espécie de “primeiro-ministro”. 

Um desses prefeitos, Carlos Martel, se destacou por conter a expansão dos árabes na Europa. Em 732, Carlos Martel venceu os árabes nos montes Pirineus, na famosa Batalha de Poitiers. Os árabes vinham do Sul da Península Ibérica, cruzaram o estreito de Gibraltar em 711, venceram os visigodos e tomaram conta de quase toda a península. 

É interessante também notar as inovações sociais que foram aparecendo nas experiências de contatos entre os homens e mulheres de civilizações diferentes daquela época. 

Na batalha com os árabes, começou a surgir uma relação importante que marcou o período feudal: a do cavaleiro com o seu senhor. Isso porque, para derrotar o famoso exército de cavaleiros árabes, Carlos Martel também precisou organizar uma forte cavalaria, algo até então pouco comum naquela Europa. 

Em função do sucesso dos cavaleiros, essa figura passou a ser central na vida medieval. A relação entre o cavaleiro que oferecia proteção e serviços militares em troca de receber terra dos senhores viria a constituir-se como “relação de vassalagem”

Note que essa era uma relação estabelecida entre nobres e não entre nobres e servos. No começo, recebia-se do Rei, depois era de outro senhor de terra. Ou seja, a partir da importância militar do exército de cavalaria, fruto de um aprendizado no enfrentamento com os árabes, estava instituída as bases da relação de vassalagem. 

Dessa experiência, Carlos Martel tomou medidas decisivas para consolidar a força militar dos francos. Uma delas foi estabelecer uma forte cavalaria, a qual passou a ser formada pelos principais guerreiros. Os membros da cavalaria, juntamente com a Igreja, eram os que mais se beneficiavam da partilha das terras após as vitórias em campo. 

Dinastia Carolíngia

Com a morte de Carlos Martel e como parte da disputa de poder interno, seu filho, Pepino, o Breve, obteve o apoio do Papa e depôs o último rei da dinastia merovíngia, em 751. Com isso, Pepino iniciou a dinastia carolíngia

Em troca do decisivo apoio da Igreja, Pepino cedeu ao Papa imensas extensões de terra no centro da Península Itálica, que ficaram conhecidas como Terras de São Pedro, o embrião do que hoje conhecemos como Vaticano. 

Depois da morte de Pepino em 768, seu filho, Carlos Magno, assumiu o trono. Governou até 814. Foi considerado o maior rei da Alta Idade Média, pois organizou um eficiente sistema administrativo capaz de suportar a expansão territorial

O período em que governou é conhecido na história como “Renascimento Carolíngio”. Ele ganhou esse nome porque Carlos Magno tentou um projeto para fazer renascer o antigo Império Romano do Ocidente. 

O “Renascimento Carolíngio” foi caracterizado pelo incentivo à cultura e ao desenvolvimento do saber. O Imperador chegou a formar um círculo de eruditos em sua corte ao qual denominava de Academia. No entanto, com a morte de Carlos Magno em 814, pouco a pouco, o saber ficou concentrado nas mãos da Igreja Católica. 

Independentemente da vontade dos reis e do clero, percebemos que, na realidade, os elementos básicos e estruturais do feudalismo estavam em pleno desenvolvimento nesse momento. Parte dessa explicação está diretamente relacionada com as decisões tomadas por Carlos Magno para a montagem do seu sistema de governo. 

Os territórios eram administrados pelos “emissários do senhor”, os Missi Dominici. Dessa maneira, parte desse sistema funcionava por meio da designação de cargos aos senhores de terra na burocracia estatal. 

Além disso, com esse modo de administrar o reinado, Carlos Magno conseguiu reequilibrar as relações entre o poder do rei, o poder da Igreja e o poder da nobreza. Ou seja, ele restabeleceu a ideia de conciliação que, anteriormente, estava a cargo da Igreja. 

Anteriormente, mencionamos que os ricos senhores de terras tinham atritos com os reis francos, pelo menos até a ascensão de Pepino, o Breve. Uma das formas de controlar a disputa pelo poder entre esses senhores foi reforçar as doações de terras conquistadas em guerras. 

Em troca, o Rei cobrava lealdade dos senhores. Ou seja: Carlos Magno impulsionou o uso das relações de vassalagem. 

Para selar esse compromisso, o Rei emitia uma espécie de documento de propriedade de terra. Esses documentos dependiam do tamanho da terra que era dividida – marcas, condados e até principados. Por sua vez, os senhores que recebiam as terras e seus documentos viravam marqueses, condes e príncipes. 

Ou seja, estamos falando da formação da classe social dos Nobres. Sim, aqueles que passamos a vida inteira ouvindo dizer que seus títulos de nobreza são hereditários e que tem a ver com “sangue azul”. 

Títulos de nobreza têm origem nos títulos de propriedade doados pelos reis no momento histórico da Alta Idade Média. No começo eram vitalícios, depois se tornaram hereditários. Ao se tornarem hereditários, não podiam ser transferidos porque, naquele momento, a terra não era um bem material monetizado. 

Pelo contrário, seu valor estava na relação de lealdade e de proteção que se estabelecia entre quem doa a terra e quem a recebe

Assim, Carlos Magno dividiu o poder entre os nobres, tendendo à descentralização política. Esses seus leais vassalos ajudavam a controlar o domínio territorial porque tinham imunidade jurídica e tributária. Ou seja, tinham o poder de criar algumas leis e, ainda por cima, não pagavam impostos. 

No entanto, durante o governo de Carlos Magno, ainda havia algum controle sobre o território. Os nobres eram inspecionados pelos Missi Dominici

Tanto durante o reinado de Clóvis quanto com Carlos Magno, os nobres arrecadavam tributos e as multas em benefício do rei, bem como recrutavam guerreiros entre os grupos um pouco mais abastados. 

Com efeito, ainda com Carlos Magno, foi ampliada a distribuição dos benefícios da terra, de modo que os beneficiados precisavam participar das expedições militares. 

Por sua vez, os guerreiros beneficiados, para assegurar a presença de homens armados em seus próprios destacamentos, também concediam benefícios a outros homens, os vassalos

Dessa forma, os senhores próximos a Carlos Magno constituíam seus próprios vassalos. Era quase uma reação em cadeia de vassalagem. Do rei para o senhor, do senhor para o cavaleiro, do cavaleiro para outro cavaleiro e sucessivamente.

Os vassalos eram donos de suas terras mediante a condição de prestar o serviço militar: tinham a obrigação de apresentar-se, juntamente com seus senhores, para ir à guerra. Como falamos acima, os benefícios eram distribuídos em forma de posses vitalícias – e, posteriormente, hereditárias. Essas posses territoriais receberam o nome de Feudos

Assim, foi se organizando a classe dominante da Idade Média: a consolidação da nobreza e o crescimento do principal meio de produção: o feudo, comandado pela nobreza

Com o fortalecimento da nobreza, gerou-se outra característica do mundo feudal, a qual já estava em pleno vapor desde o século V: a descentralização do poder político.

No ano de 800 d.C. ocorreu um evento muito representativo das relações que se constituíram durante a Idade Média e que tinha começado lá com o Rei Franco Clóvis, em 496: Carlos Magno foi coroado pelo papa Leão III como o Imperador do “Novo Império Romano do Ocidente”! 

O esplendor da Roma Antiga continuava iluminando e inspirando reis muitos séculos depois de ter sucumbido, a ponto de ser refundado. Contudo, perceba que, nesse momento, a instituição que legitimou o poder foi a Igreja Católica. 

Dali em diante, a Monarquia e a Igreja fizeram parte de um mesmo arranjo político que permitiu aos nobres permanecerem como classe dominante por muitos séculos.

Em 814, porém, a morte do Imperador representou o fim da expansão territorial e a fragmentação do último reino unificado da Europa Ocidental no período medieval. Novamente, a disputa pela sucessão do trono vem para alterar os rumos da história. 

Com efeito, após a morte de Carlos Magno o trono passou a ser ocupado por seu filho, Luís, o Piedoso. Este, por sua vez, teve três filhos: 

  • Luís, o Germânico; 
  • Lotário; e
  • Carlos, o Calvo. 

A disputa pelo poder não parou. Em 843, buscou-se uma solução e o Império foi dividido. Era o Tratado de Verdun. Com ele, o império ficou dividido assim: 

  • Luís, o Germânico, ficou com a Germânia; 
  • Lotário ficou com a região da Itália; e
  • Carlos, o Calvo, ficou com a França. 

Veja no mapa a partilha após o Tratado de Verdun

Em 987, chega ao fim a dinastia carolíngia no território da França. Hugo Capeto foi coroado na região pertencente a Carlos, o Calvo. Iniciou-se a dinastia capetíngia. Nessa altura da história, no século X, uma nova onda de invasões assolou a Europa Ocidental.

Dessa vez, foram os temidos vikings e os normandos. Alguns historiadores dizem que eles se aproveitaram das lutas fratricidas pelo poder no Império Franco para adentrar as fronteiras enfraquecidas. Além disso, essas incursões acentuaram o processo de feudalização da sociedade europeia ocidental.

Os processos de descentralização e de isolamento de grupos, famílias e comunidades se aprofundaram mais ainda. Os senhores de terras abrigavam as populações que fugiam desses povos e suas incursões violentas. 

Em troca de proteção nos castelos fortificados, as pessoas se submetiam ao poder dos nobres. Em troca dessa proteção, o homem livre trabalhava para o proprietário da terra e se tornava camponês. 

Os reis perderam a importância porque não conseguiam mais organizar a proteção e a resistência da população. Neste ponto, vale destacar algumas perguntas e respostas:

  1. Qual o nome que se dá a esses senhores das terras protegidas? 

Resposta: Senhores feudais.

  1. Qual o nome que se dá aos fugitivos que conseguiram proteção nas terras do senhor feudal em troca de trabalhar para ele? 

Resposta: Servo.

  1. Qual o nome que se dá à relação que se desenvolveu entre nobres e camponeses que aos poucos foram se submetendo ao mando dos senhores poderosos?

Resposta: Servidão.

É nesse momento, em pleno século IX, que o feudalismo se consolida como modo de vida, como sistema econômico, enfim, como uma Nova Ordem “mundial” – pelo menos, na Europa.

Sobre essa relação de servidão, é preciso explicar um elemento importante das relações sociais que foram construídas ao longo dos séculos na transição da Idade Antiga para a Idade Média.

Lembre-se de que tanto o fim do Império Romano do Ocidente quanto a presença dos povos bárbaros na Europa foram determinantes para o surgimento do feudalismo

Como os povos de origem bárbara passaram a dominar do século V em diante, seria natural que as práticas e costumes desses bárbaros adentrassem com eles nos próximos capítulos da história.

Uma dessas práticas era a forma com que os escravos bárbaros eram tratados. Diferente da maneira com que os romanos lidavam com os seus, os germânicos mantinham relações que mais se aproximavam do que eram os servos. 

Leia um trecho do livro “Costumes dos Germanos”, do historiador Tácito, de fins do século I d.C. Nesta passagem fica evidente essa diferença: 

“Não se servem dos demais escravos como nós [romanos], empregando cada um em seu trabalho de casa: deixam cada um viver separado e trabalhando para si próprio; e o senhor os faz pagar certa quantidade de cereais, gado e roupa como um lavrador, e com isso em mais nada tem que lhe obedecer o escravo. Os outros trabalhos domésticos são feitos pela mulher e pelos filhos. Poucas vezes açoitam os escravos; não os põem em cadeias nem os condenam a trabalhos. Costumam matá-los, não por castigo, mas quando os cegam o aborrecimento e a cólera, como o poderiam fazer com um inimigo, porém sem receber pena por isso. Os libertos são pouco mais estimados que os escravos, e poucas vezes têm lugar de mando na casa dos senhores e nunca nas cidades, salvo naqueles povos governados por reis”. 

Veja, então, que o modelo de relação de servidão não surgiu do nada. Ele é resultado dos costumes dos povos bárbaros e dos processos de formação política dos territórios que, em razão da descentralização do poder e da formação de comunidades comandadas por senhores, acabaram submetidos a eles. 

Com o Tratado de Verdun e com os desdobramentos seguintes, a descentralização política se acelerou mais ainda.

E então? Gostou de saber um pouco mais sobre a Alta Idade Média? Confira os próximos conteúdos a serem publicados aqui o portal sobre esse tema.

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Texto elaborado com base no material didático da professora Alê Lopes.

Referências Bibliográficas: 

1 LE GOFF, Jacques. A Civilização do Ocidente Medieval. Lisboa: Editorial Estampa. Vl. 1. 1983, p. 29. 

2 LE GOFF, Jacques, Idem. p. 27. 

3 ANDERSON, Perry. Passagens da Antiguidade ao Feudalismo. São Paulo: Ed. Brasiliense, 1989.

4 ROUCHE, Michel. Alta Idade Média Ocidental, p. 403.

5 LE GOFF, Jacques. A civilização do Ocidente Medieval, 2005. 

6 TÁCITO. A Germânia. In: PINSKY, Jaime (org.). 100 textos de História Antiga. São Paulo: Contexto, 1988. p. 74-75

7 ANDERSON, Perry. Op. Cit.,p. 126. 

8 ANDERSON, Perry. Passagens da Antiguidade ao Feudalismo. São Paulo: Ed. Brasiliense, 1989, p. 131.

9 DUBY, Georges. História artística da Europa: A idade Média. São Paulo: Ed. Paz e Terra, 1997. 

10 ARRUDA, José Jobson de A. Atlas Histórico Básico. São Paulo: Ed. Ática, 2008, p 13 

11 BASCHET, J. A civilização feudal. Do ano mil à colonização da América. São Paulo: Ed. Globo Livros, 2014

12 ARRUDA, José Jobson de A. Atlas histórico básico. São Paulo: Ática, 2008. p.15.

13 LE GOFF, Jacques. A civilização ocidental medieval. Lisboa: Ed. Estampa, 1983

14 Eadmer de Cantebury. Apud. COTRIM, Gilberto. História Global. Brasil e Geral. São Paulo: Ed. Saraiva, 2012, p. 179. 

15 COTRIM, G. Gilberto. História Global. Brasil e Geral. São Paulo: Ed. Saraiva, 2012, p. 178.

16 AMIM, Mônica. Idade Média:um tempo de fazer cristão. In: Revista ComparArte, Rio de Janeiro, Volume 01, Número 01, JanJun 2017, pp. 12116-142. 

17 Castelães, nesse caso, era o dono do castelo ou o senhor de terra.

18 KOSMINSKY, E.A. História da Idade Média. Centro do Livro Brasileiro. Sem Data. p.35.

19 Víveres eram os mantimentos ou alimentos necessários à sobrevivência

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