Tribunal de Haia: como são julgados crimes de guerra?
Fonte: UN Photo/Rick Bajornas

Tribunal de Haia: como são julgados crimes de guerra?

A invasão da Ucrânia teve início no dia 24 de fevereiro de 2022 e, desde então, o conflito não foi solucionado. Uma das medidas do presidente Volodymyr Zelensky foi recorrer ao Tribunal de Haia contra Vladimir Putin, o governante russo. O processo foi submetido à investigação no dia 27 de fevereiro. 

Porém, você sabe o que é o Tribunal de Haia e como ele atua? Confira as principais informações neste artigo do Estratégia Militares!

O que é o Tribunal de Haia? 

Imagine uma corte que julga pessoas acusadas de crimes de guerra, mas sem estar subordinada a nenhum país ou organização internacional – esse é o Tribunal de Haia. Seu nome formal é Tribunal Penal Internacional (TPI), mas é popularmente conhecido como Tribunal de Haia por se localizar na cidade de mesmo nome, nos Países Baixos. 

O TPI não substitui o sistema judiciário interno de cada nação. Na verdade, ele só atua quando há alguma falha grave no julgamento dos suspeitos ou não há nenhuma intenção de julgá-los em seus próprios países. 

No entanto, o Tribunal de Haia não tem poderes absolutos sobre todas as nações do mundo. Apenas os países que assinaram o Estatuto de Roma, que deu origem ao TPI, podem ter cidadãos julgados pela corte. Atualmente, há 123 países que aceitam sua jurisdição, inclusive o Brasil. 

Às vezes, um país que não faz parte do Tribunal de Haia pode dar permissão especial para que investigações sejam conduzidas em seu território, como foi o caso da Ucrânia. 

Estatuto de Roma 

O Estatuto de Roma é o documento base que define os ideais e os critérios para a criação do TPI. Ele começou a ser elaborado em 1988, mas só foi aceito pelos países participantes e entrou em vigor em 1o de julho de 2002. 

No entanto, houve aqueles que se abstiveram de participar e até quem se posicionou contra a criação do Tribunal, como o Catar, a China, os Estados Unidos, o Iêmen, o Iraque, Israel e a Líbia.  

No Estatuto de Roma é possível encontrar quais são os princípios-base do Tribunal de Haia, os crimes julgados, como são conduzidos os inquéritos e demais informações sobre como ele funciona. 

Se tiver interesse, você pode baixar o documento na íntegra! 

Princípios-chave do Tribunal de Haia 

O Tribunal de Haia funciona sobre alguns princípios-chave, descritos no website da corte, que orientam os procedimentos conduzidos pela instituição. 

Julgamentos são justos 

Pode parecer óbvio, mas justiça em um julgamento é um princípio mais fácil de idealizar do que alcançar. Para garanti-la, os países signatários elegem 18 juízes com mandatos de 9 anos. Eles são distribuídos entre as fases de pré-julgamento, julgamento e apelações. 

Além disso, os mandatos dos juízes não são renováveis e, geralmente, eles procedem de países diferentes. 

Procuração é independente 

O Procurador é aquele que faz a acusação dos réus. Assim como os juízes, o Procurador é eleito pelos 123 países participantes do Tribunal de Haia, da mesma forma que os demais membros da Procuradoria que o auxiliam nas investigações dos casos trazidos à corte. 

Seu mandato também é de nove anos e o Procurador não pode ser reeleito. A pessoa que atualmente ocupa o cargo é Karim Asad Ahmad Khan, um advogado do Reino Unido

Direitos dos defensores são garantidos

O Tribunal de Haia funciona sob o princípio de que o acusado é considerado inocente até que se prove o contrário. Além disso, os procedimentos contam com equipes de tradução simultânea para que os defensores sejam capazes de acompanhar sem dificuldade aquilo que é discutido na corte. 

Vítimas são ouvidas e protegidas

A participação das vítimas nos julgamentos é assegurada pelo Estatuto de Roma. Além disso, a segurança e proteção delas é garantida por uma série de procedimentos e operações. 

Comunidades distantes também são alcançadas

Não importa o quão distantes as comunidades afetadas pelos crimes estejam. O Tribunal de Haia garante que elas possam ser ouvidas como testemunhas e envolvidas nos procedimentos do julgamento. 

O princípio é que as pessoas mais afetadas pelos crimes devem ter o direito de participar e entender os processos de que fazem parte. Isso é feito por meio de encontros diretos e presenciais e na língua nativa dessas comunidades. 

Tribunal de Haia
Fonte: OSeveno, via Wikimedia Commons

Quais crimes podem ser julgados pelo Tribunal de Haia? 

Segundo o Estatuto de Roma, o Tribunal de Haia tem jurisdição sobre apenas quatro tipos principais de crimes: genocídio, crimes contra a humanidade, crimes de agressão e crimes de guerra. Geralmente, são casos de grande repercussão internacional. 

O crime de genocídio acontece quando há a intenção de destruir total ou parcialmente uma nação, etnia ou grupo religioso. Essa destruição não se resume ao ato de matar, mas inclui também danos mentais e físicos infligidos aos seus membros. 

Já os crimes contra a humanidade são violações cometidas como parte de ataques em larga escala contra qualquer população civil. Assassinato, estupro e escravização são alguns dos 15 tipos de crimes contra a humanidade listados no Estatuto de Roma. 

Crime de agressão, por sua vez, é aquele que acontece quando um Estado atenta contra a soberania, integridade e independência de outro Estado, com o uso de uma força armada. 

Por fim, há os crimes de guerra. A definição do que é e quais são os crimes de guerra estão atrelados aos tratados internacionais firmados em 1949, na Convenção de Genebra, que regulam a condução de conflitos armados. 

Qualquer ataque a pessoas que não participam das hostilidades, como civis, ou que deixaram de participar, como soldados feridos, constitui um crime de guerra. Além disso, ataques a hospitais, monumentos históricos, construções dedicadas a atividades educacionais, religiosas e artísticas também entram na categoria. 

Etapas de investigação e julgamento 

Apresentar um caso diante do Tribunal de Haia, implica em uma série de etapas que podem ser um pouco diferentes de um julgamento tradicional. 

Vale ressaltar que o TPI não possui uma força policial própria e, por isso, depende da cooperação dos países envolvidos para prender e transferir o acusado às suas instalações em Haia. Se o acusado não estiver presente, o julgamento não acontece. 

Os julgamentos submetidos ao Tribunal de Haia precisam passar pelas seguintes etapas: 

  1. Admissão preliminar: para que o processo seja aberto e as investigações tenham início, o Procurador precisa determinar se a gravidade do crime e as provas apresentadas são suficientes para abrir um processo. O crime precisa estar dentro da jurisdição do TPI.
  2. Investigações: uma vez que o processo é aceito, o Procurador começa a reunir evidências. Aqueles que são considerados suspeitos são intimados a comparecerem voluntariamente pelos juízes. Caso contrário, o TPI emite um mandado de prisão do suspeito. 
  3. Pré-julgamento: nessa fase, o suspeito faz sua primeira aparição no tribunal, os juízes confirmam sua identidade e asseguram que ele compreenda do que está sendo acusado. Após escutar o acusado, a defesa e as vítimas, os juízes decidem se há evidências suficientes para ir a julgamento. 
  4. Julgamento: o Procurador precisa provar além de qualquer dúvida que o acusado é culpado antes da sentença ser dada. Caso contrário, o julgamento é encerrado e o acusado, liberado. As sentenças do Tribunal de Haia são de até 30 anos de prisão ou, em casos excepcionais, prisão perpétua. Podem ser pedidas reparações para as vítimas também. 
  5. Apelação: tanto o procurador quanto a defesa têm o direito de apelar contra o veredicto dado no julgamento. As vítimas ou o condenado podem apelar por reparações. Os juízes que revisam o caso são sempre diferentes daqueles que deram a sentença na fase de julgamento. 

As sentenças decretadas não são cumpridas nas próprias instalações do Tribunal de Haia e, sim, nos países que se comprometeram a acatar suas decisões. Ao todo, mais de 30 casos já foram apresentados ao TPI. 

Tribunal Penal Internacional vs. Corte Internacional de Justiça

Você sabia que além de ser sede do Tribunal Penal Internacional, a cidade de Haia também abriga a Corte Internacional de Justiça? Por terem nomes parecidos, às vezes, é possível confundi-los. Mas não se engane – as duas cortes funcionam de formas diferentes. 

O TPI é aquele que costumamos chamar de Tribunal de Haia e julga apenas indivíduos que cometeram um dos quatro crimes que listamos acima. Já a Corte Internacional de Justiça (CIJ) é um órgão subordinado à ONU e atua em conflitos e controvérsias jurídicas entre Estados

O CIJ não é um tribunal criminal, ou seja, não pode punir criminalmente nenhum indivíduo. Países que são membros da ONU se comprometem a cumprirem as decisões da Corte Internacional de Justiça. 

Reunião da Assembleia de Estados participantes do TPI. Fonte: Shutterstock

Invasão à Ucrânia e o Tribunal de Haia 

No atual conflito entre a Rússia e a Ucrânia, tanto o Tribunal Penal Internacional quanto a Corte Internacional de Justiça foram acionados. A decisão do CIJ, que media as relações entre Estados, foi divulgada no dia 16 de março e determinou que a Rússia pare a invasão e retire suas forças da Ucrânia. 

o processo no Tribunal de Haia está na etapa das investigações e ainda levará um tempo para ser concluído, já que é necessário reunir evidências dos crimes pelos quais Vladimir Putin é acusado. 

A Rússia e a Ucrânia não estão entre os países signatários do Estatuto de Roma e, normalmente, não reconhecem o poder do Tribunal de Haia. Porém, o processo foi submetido ao TPI a pedido de outros 39 países participantes e a Ucrânia concedeu permissão especial para que as investigações ocorram em seu território. 

No entanto, Vladimir Putin só será condenado por crimes de guerra e crimes contra a humanidade se passar por julgamento – o que não pode acontecer a não ser que ele esteja presente. Mesmo assim, se o TPI expedir um pedido de prisão, ele não perderá a validade enquanto o líder russo viver. 

Fique atento às notícias sobre o conflito entre a Rússia e a Ucrânia e aproveite para aumentar seu conhecimento sobre a geopolítica mundial. Essas informações podem ser úteis na hora de fazer as provas dos Concursos Militares! Inscreva-se em nossa newsletter e fique por dentro dos principais assuntos do mundo militar.

CTA - Militares

Você pode gostar também