A criação
1 O inventor passava horas e horas em seu laboratório, distraindo-se com suas invenções. Eram muitas, mas era uma só, porque, na verdade, tudo que inventava era um passo na : concretização de um único sonho. Havia construído diversas máquinas interessantes e, como degraus, essas máquinas O “ajudavam a construir outras mais sofisticadas, de modo que se poderia dizer que se tratava de uma evolução.
'2 O seu sonho, porém, era o de construir uma máquina, não propriamente perfeita, queria construir uma máquina à sua “Imagem e semelhança.
3 Certo dia, ao entrar em seu laboratório, viu que as suas invenções quase não precisavam dele, pois tudo funcionava quase que em perfeita harmonia. No entanto, havia ainda o seu ambicioso projeto de fazer um aparelho como se fosse um filho , igualzinho ao próprio criador . E tudo isso fazia apenas por impulso de criação, sem nenhuma vaidade ou intenção pessoal.
4 Enquanto meros m autonomia, mas eram mecanismos, as máquinas não tinham autonomia, mas eram de tal forma evoluídas, que já se reproduziam a si mesmas, apenas renovando material, de modo que se mantinham sempre em igual número. O inventor às vezes se surpreendia admirando essa autonomia das próprias invenções e se sentia mais capaz ainda, na medida em que havia conseguido inventar inventos Inventores. Só que esses inventos ainda não eram criativos, apenas se reproduziam mecanicamente.
5 Um certo dia, tendo conseguido projetar uma placa-mãe com as características que acreditava serem necessárias para fazer o seu robô funcionar à sua própria semelhança, pôs-se, com entusiasmo, a montar o aparelho. Levou alguns dias e acabou podendo testá-la.
6 Após alguns testes, parecendo que a máquina funcionava bem, e era mais inteligente que as outras, O inventor ficou mais tranquilo, provando para si mesmo que era capaz. Eles havia escolhido essa invenção para ser o máximo de toda a sua obra e a tinha como um filho; para este filho tudo o mais estava à disposição, e, passando a amá-lo de tal forma, quis que pudesse ter vida própria, o que implicava tomar decisões. Mas, é verdade, O inventor não sabia muito bem o que significava tomar decisões, e o pretendia apenas por intuição, pois não queria tal sofrimento a quem amava.
7 Depois de um teste mais avançado, percebeu que deveria aumentar a capacidade de memória do aparelho. De repente, uma pane ocorreu. O cientista ficou preocupado e logo abriu O chassi para ver o que havia ocorrido. O chassi era um peito oco e dentro dela, na placa-mãe, pôde notar que um liquido havia escorrido. Como não descobria a causa e isso teimasse em acontecer, Instalou um tubinho para jogar fora a inexplicável secreção.
8 Em algum lugar nos arquivos da prodigiosa máquina, porém, estava registrado que ela percebeu-se a si mesma viu que era uma consciência. Era uma consciência aprisionada num amontoado de metal ligado por parafusos e encaixes por slots. Mirou o nada que se constituiu o seu Interior e havia a idéia. Essa Idéia era a idéia, inclusive, de que havia um inventor. Um inventor que jamais veria cu conseguiria entender. Enquanto algo estranho a uma máquina abalava seu peito oco, um líquido escoria pela placa-mãe, provocando instabilidade. Uma máquina que sente nostalgia já não é uma máquina, é um paradoxo. Pode tomar decisões e, limitadamente, tem a liberdade de se construir a si mesma.
9 O Inventor não sabia que isso ocorria no Intimo da máquina, de maneira que não conseguia consertar suas instabilidades. Mas olhou para aquilo e viu que era bom: não era perfeito e, por isso, era bom, pois era realmente à sua imagem e semelhança. A liberdade da máquina faz com que deixe de ser máquina é que prepotente, procure afastando-se seus próprios de qualquer caminhos, tipo dede modo ajuda.muitas vezes liga controle,
10 Quando a uma pois fonte a só invenção de lhe energia. resta adquire destruí-la, Entretanto, criar verdadeiramente significa ir à última das consequências que é amar a criatura e, por isso, nem destrói nem controla. Apenas sofre vendo que aquilo que nem precisaria existir agora busca desesperadamente a si mesmo e nada mais.
O Leviatã — João Bosco da Encarnação (adaptado)
Que”passagens do texto mostram o processo de “libertação” da máquina?