Cecília Meireles

De seu calmo esconderijo,

o ouro vem, dócil e ingênuo;

torna-se pó, folha, barra,

prestígio, poder, engenho...

É tão claro! – e turva tudo:

honra, amor e pensamento.

Borda flores nos vestidos,

sobe a opulentos altares,

traça palácios e pontes,

eleva os homens audazes (...)

Pelos córregos, definham

negros, a rodar bateias.

Morre-se de febre e fome

sobre a riqueza da terra (...)

Por ódio, cobiça, inveja,

vai sendo o inferno traçado.

Os reis querem seus tributos

— mas não encontram vassalos.

Mil bateias vão rodando,

mil bateias sem cansaço.(...)

Mas vão sendo fabricadas

Muitas algemas de ferro.

Texto 2: O Sino de Ouro

Rubem Braga

Contaram-me que, no fundo do sertão de Goiás, (...)

nessa povoação de poucas almas (...), e mesmo a igreja é pequena, contaram-me que ali tem – coisa bela e espantosa – um grande sino de ouro.

É apenas um sino, mas é de ouro. De tarde seu sorriso vai voando em ondas mansas sobre as matas e os cerrados (...). E a cada um daqueles homens pobres ele dá cada dia sua ração de alegria. Eles sabem que de todos os ruídos e sons que fogem do mundo em procura de Deus – gemidos, gritos (...) orações, e o murmúrio temeroso (...) das grandes cidades que esperam a explosão atômica (...) – eles sabem que Deus, com especial delícia e alegria, ouve o som alegre do sino de ouro perdido no fundo do sertão. E então é como se cada homem, o mais pobre, o mais doente e humilde, o mais mesquinho e triste, tivesse dentro da alma um pequeno sino de ouro. (...)

Ouro que não serve para perverter, nem o homem nem a mulher, mas para louvar a Deus.

Vocabulário - 

Texto 1:

turva: escurece

opulentos: ricos, luxuosos

audazes: corajosos, ousados

cobiça:desejo desmedido por riquezas

bateia: espécie de peneira usada na busca do ouro

tributo: imposto

vassalos: subordinado, submisso

Texto 2:

perverter: tornar perverso ou mau; corromper

“De seu calmo esconderijo,/o ouro vem, dócil e ingênuo”. Esses dois versos, no poema de Cecília Meireles,