TEXTO I
Cultura Brasileira: da diversidade à desigualdade
O Brasil da diversidade é,ao mesmo tempo, o país da desigualdade
Paulo Silvino Ribeiro
Mesmo admitindo a existência de diversos estudos e discussões antropológicas sobre o conceito de cultura, podemos considerá-la, grosso modo, da seguinte forma: a cultura diz respeito a um conjunto de hábitos, comportamentos, valores morais, crenças e símbolos, dentre outros aspectos mais gerais, como forma de organização social, política e econômica, que caracterizam uma sociedade. Além disso, os processos históricos são em grande parte responsáveis pelas diferenças culturais, embora não sejam os únicos fatores a
se considerar. Isso nos permite afirmar que não existem culturas superiores ou inferiores, mas sim diferentes, com processos históricos também diversos, os quais proporcionaram organizações sociais com determinadas peculiaridades. Dessa forma, podemos pensar na seguinte questão: o que caracteriza a cultura brasileira? Certamente, ela possui suas particularidades quando comparada ao restante do mundo, principalmente quando nos debruçamos sobre um passado marcado pela miscigenação racial entre índios, europeus e africanos.
A cultura brasileira em sua essência seria composta por uma diversidade cultural, fruto dessa aproximação que se desenvolveu desde os tempos de colonização, a qual, como sabemos, não foi, necessariamente, um processo amistoso entre colonizadores e colonizados, entre brancos e índios, entre brancos e negros. Porém, ao retomarmos a ideia de cultura, adotada no início do texto, podemos afirmar que, apesar desse contato hostil num primeiro momento entre as etnias, o processo de mestiçagem contribuiu para a diversidade da cultura brasileira no que diz respeito a costumes, práticas, valores, entre outros aspectos que poderiam compor o que alguns autores chamam de caráter nacional.
Ainda hoje há quem possa acreditar que nossa mistura étnica tenha promovido uma democracia racial ao longo dos séculos, com maior liberdade, respeito e harmonia entre as pessoas de origens, etnias e cores diferentes. Contudo, essa visão pode esconder algumas armadilhas. Nas ciências sociais brasileiras, não são poucos os autores que já apontaram a questão da falsidade dessa democracia racial, alertando para a existência de um racismo velado, implícito, muitas vezes, nas relações sociais. Dessa forma, o discurso da diversidade (em todos os seus aspectos, como em relação à cultura), do convívio harmônico e da tolerância entre brancos e negros, pobres e ricos acaba por encobrir ou sufocar a realidade da desigualdade, tanto do ponto de vista racial como de classe social. Ainda hoje, mesmo com leis claras contra atos racistas, é possível afirmarmos a existência do preconceito de raça na sociedade brasileira, no transporte coletivo, na escola, até no ambiente de trabalho.
É preciso considerar que a escravidão trouxe consequências gravíssimas de ordem econômica para a formação da sociedade brasileira, uma vez que os negros (pobres e marginalizados em sua maioria) até hoje não possuem as mesmas oportunidades, criando-se uma enorme distância entre as estratificações sociais. Como sugere o antropólogo Darcy Ribeiro, mais do que preconceitos de raça ou de cor, têm os brasileiros um forte preconceito de classe social.
Dessa forma, o Brasil da diversidade é, ao mesmo tempo, o país da desigualdade. Por isso tudo é importante que, ao iniciarmos uma leitura sobre a cultura brasileira, possamos ter um senso crítico mais aguçado, tentando compreender o processo histórico da formação social do Brasil e seus desdobramentos no presente para além das versões oficiais da história.
(Disponível em: https://brasilescola.uol.com.br/sociologia/cultura-brasileira-diversidade-desigualdade.htm Com adaptações. Acessado em 01/08/2018)
TEXTO II
HISTÓRIA PRA NINAR GENTE GRANDE
Sinopse 2019- GRES Estação Primeira de Mangueira.
HISTÓRIA PRA NINAR GENTE GRANDE é um olhar possível para a história do Brasil. Uma narrativa baseada nas “páginas ausentes”. Se a história oficial é uma sucessão de versões dos fatos, o enredo que proponho é uma “outra versão”. Com um povo chegado a novelas, romances, mocinhos, bandidos, reis, descobridores e princesas, a história do Brasil foi transformada em uma espécie de partida de futebol na qual preferimos “torcer” para quem “ganhou”. Esquecemos, porém, que, na torcida pelo vitorioso, os vencidos fomos nós.
Ao dizer que o Brasil foi descoberto e não dominado e saqueado; ao dar contorno heroico aos feitos que, na realidade, roubaram o protagonismo do povo brasileiro; ao selecionar heróis "dignos" de serem eternizados em forma de estátuas; ao propagar o mito do povo pacífico, ensinando que as conquistas são fruto da concessão de uma “princesa” e não do resultado de muitas lutas, conta-se uma história na qual as páginas escolhidas o ninam na infância para que, quando gente grande, você continue em sono profundo.
Não à toa, o termo “DESCOBRIMENTO” ainda é recorrente quando, na verdade, a chegada de Cabral às terras brasileiras representou o início de uma “CONQUISTA”. E, ao ser ensinado que foi “descoberto” e não “conquistado”, o senso coletivo da “nação” jamais foi capaz de se interessar ou dar o devido valor à cultura indígena, associando-a “a programas de gosto duvidoso” ou comportamentos inadequados vistos como “vergonhosos”.
Levando em conta apenas pouco mais de 500 anos, a narrativa tradicional escolheu seus heróis, selecionou os feitos bravios, ergueu monumentos, batizou ruas e avenidas, e assim, entre o “quem ganhou e quem perdeu”, ficamos com quem ganhou. Índios, negros, mulatos e pobres não viraram estátuas. Seus nomes não estão nas provas escolares. Não são opções para marcar “x” nas questões de múltiplas escolhas.
Cientes de que nossa história é de luta, teremos orgulho do Brasil. Alimentados de leite novo e bom, varreremos de nossos “porões” o complexo de “vira-latas”, que fomenta nossa crença de inferioridade. Veremos tanta beleza na escultura de ANTÔNIO FRANCISCO LISBOA quanto no quadro que eterniza o sorriso da Monalisa. Nos orgulharemos do “tupi” que falamos – mesmo sem saber. Daremos mais cartaz ao saci do que à “bruxa”. Brincaremos mais de BUMBA MEU BOI, CIRANDA E REISADO. Nossas crianças enxergarão tanta coragem no CANGACEIRO quanto no “cowboy”. Vibraremos quando SUASSUNA estrear em “ROLIÚDE” sem tradução para o SOTAQUE de João Grilo e Chicó. Não estranharemos caso o Mickey suba a ESTAÇÃO PRIMEIRA, troque "mylove" por "minha nêga" e mande pintar o "parquinho" da Disney com o VERDE E O ROSA DA MANGUEIRA.
(Disponível em: http://www.mangueira.com.br/carnaval-2019/enredo. Com adaptações. Acessado em 25/08/2018).
Atlas da Violência 2018

Uma das principais facetas da desigualdade racial no Brasil é a forte concentração de
homicídios na população negra. Quando calculadas dentro de grupos populacionais de negros
(pretos e pardos) e não negros (brancos, amarelos e indígenas), as taxas de homicídio revelam a magnitude da desigualdade. É como se, em relação à violência letal, negros e não negros vivessemem países completamente distintos. Em 2016, por exemplo, a taxa de homicídios de negros foi duas vezes e meia superior à de não negros (16,0% contra 40,2%). Em um período de uma década, entre 2006 e 2016, a taxa de homicídios de negros cresceu 23,1%. No mesmo período, a taxa entre os não negros teve uma redução de 6,8%. Cabe também comentar que a taxa de
homicídios de mulheres negras foi 71% superior à de mulheres não negras.
(Disponível em http://www.ipea.gov.br/portal/index.php?option=com_content&view=article&id=33410. Com adaptações. Acessado em 20/08/18).
Os dados revelados no Atlas da Violência 2018 traçam um perfil do panorama de desigualdade social existente no Brasil, principalmente, no que diz respeito às vítimas de violência. Diante disso, assinale a alternativa em que a questão do preconceito racial esteja mais aparente.