TEXTO I
Admirável bairro novo
Ninguém quer morar em lugar feio ou longe daquilo que lhe é mais prático. Melhorias são sempre bem-vindas, mas repare que, quando os benefícios chegam, até o preço do pãozinho fica diferenciado. E aí a supervalorização bate na porta de casa avisando que o aluguel será reajustado. Quem ali já estava muitas vezes não consegue mais sustentar esse padrão de vida que foi imposto. Ironicamente, acaba tendo que se mudar para outra região, possivelmente com mais carências. Quer dizer, as melhorias foram para quem?
Esse processo, chamado de gentrificação, ultrapassa a prática positiva da revitalização. Disfarçado de desenvolvimento e muitas vezes confundido com progresso, funciona como uma espécie de filtragem social por meio das leis de mercado. Pode afetar todo mundo: você, o vizinho, o dono do mercadinho e até o empresário bem-sucedido, mas, se há um alvo certeiro, são as classes de renda mais baixa. É o que faz com que os reparos realizados naquele bairro não sejam destinados aos que ali habitam e sim àqueles que ainda virão.
Apontar um culpado por esse processo não é tão simples. Pode ser a revitalização de uma praça, um novo comércio ou espaço artístico, um prédio recém-construído, um serviço público disponibilizado. A discussão persiste há décadas no mundo inteiro, mas ganhou novo fôlego por aqui depois que o país passou a sediar grandes festivais de música, uma Copa do Mundo e se prepara para as Olímpiadas de 2016. Segundo dados da rede de pesquisas Observatório das Metrópoles, coordenado pela UFRJ (Universidade Federal do Rio de Janeiro), estima-se que mais de 200 mil pessoas tenham sido removidas ou estejam ameaçadas de remoção por causa dos projetos esportivos e da consequente supervalorização das áreas destinadas a esses megaeventos.
Foi por isso que, no início do ano passado, a revista "The New Yorker" chamou a Arena Corinthians, em São Paulo, de "monumento à gentrificação", argumentando que a imponência do estádio contrasta com "a arruinada Zona Leste" e poderia aumentar o abismo da desigualdade social, guiada pela especulação imobiliária. De fato, nos últimos seis anos o aluguel de três dormitórios na região subiu 139,8%, de acordo com a Fundação Seade (Sistema Estadual de Análise de Dados), vinculada à Secretaria de Planejamento e Gestão do Estado de São Paulo.
(Disponível em: <https://tab.uol.com.br/gentrificacao/> Acesso em 26 mai. 2020)
Com relação à classificação do texto, é possível afirmar que