TEXTO VI
Medo de saci
Pedrinho, naqueles tempos, costumava passar as férias no sítio de Dona Benta, onde brincava de tudo, como está nas Reinações de Narizinho e na Viagem ao céu. Só não está contado o que lhe aconteceu antes da famosa viagem ao céu, quando andava com a cabeça cheia de sacis.
A coisa foi assim. Estava ele na varanda com os olhos no horizonte, posto lá onde aparecia o verde- escuro do Capoeirão dos Tucanos, a mata virgem do sítio. De repente, disse:
— Vovó, eu ando com ideias de ir caçar na mata virgem.
Dona Benta, ali na sua cadeirinha de pernas cotós, entretida no tricô, ergueu os óculos para a testa.
— Não sabe que naquela mata há onças? — disse com ar sério — Certa vez uma onça pintada veio de lá, invadiu aqui o pasto e pegou um lindo novilho da vaca Mocha.
— Mas eu não tenho medo de onça, vovó! — exclamou Pedrinho, fazendo o mais belo ar de desprezo.
Dona Benta riu-se de tanta coragem.
— Olhem o valentão! Quem foi que naquela tarde entrou aqui berrando com uma ferroada de vespa na ponta do nariz?
— Sim, vovó, de vespa eu tenho medo, não nego — mas de onça, não! Se ela vier do meu lado, prego- lhe uma pelotada do meu bodoque novo no olho esquerdo; e outra bem no meio do focinho e outra...
— Chega! — interrompeu Dona Benta, com medo de levar também uma pelotada.
— Mas, além de onças, existem cobras. Dizem que até urutus há naquele mato.
— Cobra? — e Pedrinho fez outra cara de pouco caso ainda maior. — Cobra mata-se com um pedaço de pau, vovó. Cobra!... Como se eu lá tivesse medo de cobra...
Dona Benta começou a admirar a coragem do neto, mas disse ainda:
— E há aranhas caranguejeiras, daquelas peludas, enormes, que devoram até filhotes de passarinho.
O menino cuspiu de lado com desprezo e esfregou o pé em cima.
— Aranha mata-se assim, vovó — e seu pé parecia mesmo estar esmagando várias aranhas caranguejeiras.
— E também há sacis — rematou Dona Benta.
Pedrinho calou-se. Embora nunca o houvesse confessado a ninguém, percebia-se que tinha medo de saci.
Nesse ponto, não havia nenhuma diferença entre ele, que era da cidade, e os demais meninos nascidos e crescidos na roça. Todos tinham medo de saci, tais eram as histórias correntes a respeito do endiabrado moleque duma perna só.
Desde esse dia, ficou Pedrinho com o saci na cabeça. Vivia falando em saci e tomando informações a respeito. Quando consultou tia Nastácia, a resposta dela foi, depois de fazer o sinal da cruz e dizer "Credo!".
— Pois saci, Pedrinho, é uma coisa que gente da cidade nega, diz que não há — mas há. Não existe velho por aí, desses que nascem e morrem no meio do mato, que não jure ter visto saci. Nunca vi nenhum, mas sei quem viu.
— Quem?
— O tio Barnabé. Fale com ele. Homem sabido está ali! Entende de todas as feitiçarias e de saci, de mula-sem-cabeça, de lobisomem — de tudo.
Pedrinho ficou pensativo.
LOBATO, Monteiro. O Saci / Monteiro Lobato. São Paulo: Brasiliense, 2005.(Adaptado)
Vocabulário:
Cotós: pequenas / baixa estatura.
Novilho: boi novo/ bezerro.
Pelotada: pedras pequenas de barro.
Bodoque: arco utilizado para arremessar bolas pequenas.
Urutu: cobra temida pelo poder do veneno.
Sobre o narrador do texto 1, pode-se afirmar que está em:
TEXTO VII
Cidade Invisível: os gringos entenderam o folclore brasileiro? Confira!
16/02/2021 às 21:00 Jean Carlos Foss
Cidade Invisível, a mais nova produção brasileira da Netflix vem ganhando notoriedade na plataforma. A série, que aborda o universo do folclore brasileiro, se passa em um Brasil no qual, secretamente, as lendas urbanas e contos fantásticos são reais.
Na região brasileira, a série alcançou o topo das mais assistidas do streaming. E, fora do Brasil, a produção também está se tornando extremamente popular. Nos Estados Unidos, Cidade Invisível também está, atualmente, em 1º lugar no top 10 da Netflix.
Além disso, a série tem apresentado uma boa performance entre a crítica internacional. No Decider, por exemplo, o projeto foi qualificado como envolvente e as atuações, incluindo a de Marco Pigossi, foram destacadas. Apesar disso, a falta de explicação para algumas das lendas apresentadas na série foi notada pelos críticos.
De acordo com o ReadySteadyCut, o tom misterioso da série chama a atenção e rende uma comparação honrosa com o sucesso dos anos 90, Arquivo X. Ademais, o site apontou a rapidez e dinâmica dos episódios como fatores importantes para prender a atenção de diversos tipos de público.
Fãs de todo o mundo reagem à Cidade Invisível através das redes sociais
No Twitter, a comoção dos fãs americanos está sendo notada pelo público brasileiro. Sob o nome Invisible City, os assinantes gringos elogiaram bastante a produção brasileira.


Vocabulário:
Streaming: plataforma de filme, série e músicas com transmissão em tempo real de conteúdos.
Performance: desempenho.
Texto VIII
Conheça as lendas italianas que inspiraram Luca, novo filme da Pixar
O polvo que salvou uma cidade de piratas. O menino que, à la Atlas, sustenta a ilha da Sicília. Saiba quais referências ajudaram a criar o filme que estreia sexta (18) no Disney+.
Por Maria Clara Rossini 17 jun 2021, 21h04
Mar azul, cidades históricas, sol a pino, brisa litorânea. Um gelato de pistache depois de uma pratada de espaguete ao pesto. Com a pandemia (e a conversão euro-real de doer o bolso), fica difícil vivenciar experiências tipicamente italianas. O jeito, então, é dar “play” no novo filme da Pixar.
Luca, que estreia nesta sexta (18) no Disney+, acontece durante o verão de uma pequena cidade da Riviera italiana entre as décadas de 1950 e 1960. Ele conta a história de Luca e Alberto – dois monstros marinhos que assumem uma forma humana quando saem do submundo aquático onde vivem.
Luca é um garoto tímido e fascinado pela superfície, mas seus pais o proíbem de ir à cidade (alô, Pequena Sereia). Já Alberto é uma criatura extrovertida que adora sair da água e está sempre atrás de aventuras.
A ideia de juntar Itália e criaturas mitológicas não foi à toa: toda a região litorânea do país possui dezenas de lendas sobre monstros marinhos. “Em Cinqueterre, por exemplo, sempre existiram lendas do tipo ‘não vá para aquele canto, tem um monstro ali' ”, disse Enrico, o cineasta.
Nem todas as lendas que ele ouvia, claro, eram feitas para afastar crianças. O cineasta lembrou também do conto de Polvo de Tellaro, outra vila litorânea próxima a Cinqueterre. Reza a lenda que Tellaro era encarregada de proteger a região de piratas. Toda vez que um navio pirata era avistado no horizonte, o sino da igreja tocava – e os moradores se preparavam para defender a cidade.
Contudo, em uma madrugada de tempestade, quando menos se esperaria um navio, toda a vila acordou com o barulho do sino. Ao olhar para a igreja, os moradores teriam visto um polvo tocando o sino. Era um alerta para a chegada dos piratas.
É por isso que o polvo é considerado o protetor de Tellaro. A cidade é cheia de referências ao animal: azulejos, maçanetas, placas e, claro, lembrancinhas.
https://super.abril.com.br/cultura/conheca-as-lendas-italianas-que-inspiraram-luca-novo-filme-da-pixar. Acesso em 10 de agosto de 2021.(Adaptado)